Giro fiscal – 31 de março a 6 de abril

Giro fiscal – 31 de março a 6 de abril

06/04/2020

O Congresso tomou a dianteira no debate e rápida aprovação de propostas, e algumas medidas de combate à crise da pandemia estão prontas para serem colocadas em funcionamento e outras regras, como a PEC do chamado “orçamento de guerra” podem ser aprovadas hoje em votação definitiva no Senado e/ou Câmara. Já com o crédito, as notícias ainda são de empoçamento da liquidez. O debate, contudo, continua intenso. E apesar da riqueza desse momento, esse giro será suspenso por algumas semanas pela dificuldade desta jornalista em acompanhar este debate com a atenção necessária.

Muito além do Giro, este Observatório continua acompanhando as medidas anunciadas no Brasil e em outros países. O levantamento indica que no mundo “o foco das ações tem sido o crédito, principalmente para MPEs, de modo a manter o custeio das empresas: aluguéis, salários, impostos, etc. Essa é uma fragilidade, por enquanto, da resposta brasileira. A continuar essa tendência haverá mais pressão por medidas fiscais compensatórias que, por este levantamento, já atinge patamares mais próximos do que vemos em outros países”, observou Manoel Pires, responsável pelo levantamento. Em outro artigo, no blog do Ibre, Pires discute que existe uma clara relação entre as medidas fiscais e o crédito: países que adotam mais crédito, por enquanto, usam menos a política fiscal e vice-versa, e também mostra o peso de cada uma no pacote anticrise de cada país.

O BC  e o crédito
Neste fim de semana, Paulo Guedes  se alinhou com economistas que já manifestaram a preocupação em garantir que recursos liberados pelo governo cheguem efetivamente às mãos dos empresários, e defendeu que o governo pode adotar medida semelhante à já adotada por outros países onde os BCs vão fazer compra direta de carteiras de crédito e títulos das empresas (há quem defenda e há considere essa medida um risco, ver sessão de artigos). E em videoconferência com parlamentares do DEM, o ministro defendeu congelar o salário dos servidores por dois anos, sem redução.

Manifesto antidemisssão
E em manifesto na internet, dirigentes de grandes empresas, como Bradesco, WEG, Suzano, Magazine Luiza, Alpargatas, estão defendendo a não demissão de trabalhadores. Mais de mil empresas já estariam comprometidas com a iniciativa. O site é https://www.naodemita.com/.

Impacto fiscal
O rígido ajuste fiscal em curso antes da crise do Coronavirus fez com que, em 2019, o investimento público recuasse ao menor nível em 47 anos.  E dos R$ 5 bilhões extras do Ministério da Saúde para o combate ao coronavírus, 20% foram gastos em março, segundo dados do Contas Abertas, divulgados pelo Valor. No Portal da Transparência, por meio da ação orçamentária “21C0”, é possível consultar e detalhar gastos diretos feitos no combate à pandemia, bem como transferências aos Estados e municípios. . Nas contas da equipe econômica, a queda na receita líquida pode ser de R$ 150 bilhões este ano. Mansueta Almeida, secretário do Tesouro, em entrevista ao Estadão, defendeu a importância de gastos excepcionais para enfrentar a crise, mas sem farra fiscal e sem usar a excepcionalidade para outros gastos que não os relacionados ao combate à pandemia e seus efeitos. Entidades que reúnem auditores fiscais elaboraram propostas fiscais para enfrentar a crise, entre elas o aumento da carga tributária de setores menos afetados pela crise. Alguns Estados negociam empréstimos com organismos multilaterais novos empréstimos ou remanejamento, para a saúde, de financiamentos já concedidos.

Andamento das propostas
Na sexta-feira, o governo publicou a Lei que criou o auxílio de R$ 600 reais para os informais e também editou uma Medida Provisória que abre um crédito extraordinário de R$ 98 bilhões para o Ministério da Cidadania implementar o benefício. Antes, na quinta, outras cinco MPs liberaram créditos de R$ 16 bi para Estados e municípios e mais R$ 9 bilhões para a Saúde. E nesta segunda pode começar a ser liberado os recursos da MP 944, par ao pagamento dos salários de pequenas e médias empresas.

O governo também editou a MP que abre a possibilidade de redução de salário e jornada, com ou sem compensação de parte do salário pelo governo. Corte salarial até 25% não será compensado. As regras geraram dúvidas, e alguns questionaram os valores envolvidos. O salário-hora, afirmou o governo, não será reduzido. E quem tiver contrato suspenso ou redução de salário, pode ter que contribuir de forma avulsa para o INSS se não quiser interromper o tempo de contribuição ou ser impactado pela redução salarial. E a medida que permite adiamento do pagamento de alguns tributos federais, como a contribuição ao INSS e do PIS/Pasep foi publicada na sexta-feira, dia 3, no Diário Oficial. O Comitê Gestor do Simples também alterou o prazo de recolhimento de tributos, para MEIS e micro empresas.

A Câmara aprovou, na sexta (com duas votações), a PEC do chamado “orçamento de guerra”. Além de liberar o governo de cumprir a regra de ouro, a PEC dá mais instrumentos para o BC estabilizar o mercado com compra e venda de títulos do Tesouro. No Senado, foi aprovada o projeto que suspende vários prazos contratuais até 30 de, mas o relatório retirou algumas propostas, como a que permitia o adiamento dos alugueis.

Artigos & entrevistas
Raghuran Rajan: A ordem das prioridades deve ser conter a pandemia, preservar vidas - oferecendo recursos para os pobres sobreviverem - e manter estruturas econômicas para que possa haver crescimento quando a fase crítica da pandemia passar.

Marcos Lisboa: A saúde e  a proteção das famílias mais vulneráveis devem ser as prioridades, mas é preciso ficar atento porque o país está hipotecando seu futuro. Por aqui, diz, a reação está muito descontrolada e pode abrir espaço para medidas “oportunistas”.

Nelson Barbosa: o combate à crise do Covid-19 será pago com emissão de dívida, medida que hoje é consenso entre os economistas. Depois, diz, assim como hoje “todos corretamente admitem isolamento social para achatar a curva de contágio da Covid-19, espero que a mesma lógica seja aplicada no pós-crise, para achatar o custo social do ajuste fiscal que será necessário.”

José Roberto Afonso: “O coronavírus só transformou em físico o isolamento que era social e econômico, uma realidade para parcela enorme e crescente da população, sobretudo a brasileira, sem acesso ao emprego formal”

Arthur Koblitz:   O governo não explora o potencial do BNDES, argumentou o presidente da associação dos funcionários do banco, em artigo na Folha. Segundo ele, o banco ainda tem entre TR$ 100 bilhões e R$ 150 bilhões para injetar na economia.

Rodrigo Zeidan: O Banco Central liberou quase R$ 1 trilhão, mas o dinheiro continua parado por causa do risco das pequenas e médias empresas, especialmente. Para destravar o uso destes recursos, ele defende que o BNDES assuma parte do risco dos empréstimos. E logo.

Durante a crise sanitária, os servidores públicos deveriam ter jornada e salário reduzidos? Para Manoel Pires, não. Para  André Luiz Marques , sim.

Vinicius Torres Freire: “Dinheiro novo mesmo, são R$ 200 bilhões.”

Ricardo Paes de Barros: Depois do auge da crise, alguns informais vão precisar de ajuda por mais tempo. Mas o país precisa ser seletivo.

Eduardo Zilberman – defende que, no Brasil, propostas que envolvam o BC financiar o Tesouro, deve ser evitada. Ele vê risco de amplificar a crise com uma crise adicional de confiança. O aumento do gasto fiscal deve ser financiado pelo aumento da dívida pública, defende.

Gustavo Loyola: A ideia de que o isolamento drástico traz menos prejuízos para a economia que o “isolamento vertical” é uma falácia e não é o momento de se perder tempo com debates inúteis.


As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV. 

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