Atualização da Decomposição de juros nominais líquidos pagos no Brasil (2002-2024)

Atualização da Decomposição de juros nominais líquidos pagos no Brasil (2002-2024)

18/02/2025

Introdução

Há alguns meses apresentamos uma proposta de decomposição dos juros nominais líquidos pagos pelo governo brasileiro, realizando uma análise desde 2002 até meados de 2024 (Borça Jr., 2024).

Naquela oportunidade a proposta de decomposição da parcela de juros líquidos nominais teve por base o trabalho de Borça Jr. e Babosa-Filho (2023), e dividia-se em cinco componentes: (i) resultado das operações de swaps cambiais do Banco Central do Brasil (BCB); (ii) juro real, que representa o valor do juro real incidente sobre a dívida líquida do setor público (DLSP) excluindo a base monetária, isto é, a dívida que efetivamente rende juros; (iii) correção monetária, que representa o crescimento dos valores pagos em função da alta do nível geral de preços; (iv) custo de carregamento dos ativos de renda fixa do governo, que representa o diferencial de juros entre os ativos do governo e o custo de oportunidade de financiamento do Tesouro Nacional; e (v) efeito cruzado de inflação e juro real, que são insignificantes do ponto de vista econômico, mas necessários para completar a matemática de decomposição do juros.

O objetivo desse post é fazer a atualização daquelas informações com os dados fechados de 2024.

O resultado primário consolidado do setor público brasileiro teve uma melhora significativa entre 2023 e 2024. De acordo com dados do BCB, que apura as estatísticas fiscais “abaixo da linha”, a necessidade de financiamento do setor público no conceito primário saiu de R$ 249,1 bilhões, ou 2,3% do PIB, em 2023, para R$ 47,6 bilhões em 2024, o que é equivalente a 0,4% do PIB.

No entanto, essa melhoria no resultado primário fiscal consolidado teve impacto marginal na estatística de resultado nominal, a qual soma a despesa líquida com pagamento de juros nominais ao resultado primário. O déficit nominal brasileiro atingiu valores próximos de R$ 1 trilhão (mais precisamente, R$ 998 bilhões) em 2024, partindo de R$ 967,4 bilhões em 2023. Em percentual do PIB, o déficit nominal caiu de 8,8% em 2023, para 8,5% do PIB ao fim de 2024. Essa dinâmica é explicada principalmente pelo crescimento significativo das despesas líquidas com os juros nominais, que saltaram de 6,6% do PIB, em 2023, para 8,0% em 2024.

O Gráfico 1 apresenta os números de resultado primário e resultado nominal em percentual do PIB.

Gráfico 1. Necessidade de financiamento do setor público (NFSP)
consolidado no conceito nominal – resultado primário e pagamento de juros líquidos nominais

(% PIB)

Gráfico</p>
<p>Descrição gerada automaticamente

Fonte: BCB

 

Resultados recentes

O Gráfico 2 mostra a trajetória do pagamento de juros nominais líquidos do governo entre 2002-2024, segmentando os ganhos e perdas do BCB que tiveram origem nas operações com derivativos cambiais.

Gráfico 2. Pagamento líquido de juros nominais
no Brasil – swaps e demais componentes (% PIB)

Gráfico, Gráfico de barras, Histograma</p>
<p>Descrição gerada automaticamente

Fonte: BCB

Nota-se que a alta de 6,6% para 8,0% do PIB do pagamento de juros líquidos nominais de 2023 para 2024 deveu-se ao resultado dos swaps cambiais do BCB por meio de suas intervenções no mercado de câmbio via derivativos cambiais. Em 2023, o resultado dos swaps havia sido favorável para as contas do governo, tendo contribuído para reduzir o pagamento de juros nominais em 0,6% do PIB. Em 2024, especialmente por conta do processo de depreciação cambial ocorrido no fim do ano, o resultado dos swaps cambiais contribuiu para aumentar o pagamento de juros em 1,0% do PIB. Portanto, a variação da contribuição dos swaps cambiais entre 2023 e 2024 foi da ordem 1,6 p.p. do PIB, explicando praticamente toda elevação do pagamento de juros nominais, de 6,6% para 8,0%.

No fim de 2024, a depreciação cambial ocorrida também fez com que o governo vendesse uma parcela de suas reservas internacionais. O Gráfico 3 apresenta a posição cambial líquida do governo, combinando tanto a posição em reservas internacionais quanto a posição em derivativos cambiais.

Gráfico 3. Posição cambial líquida (em US$ bilhões)

Gráfico, Histograma</p>
<p>Descrição gerada automaticamente

Fonte: BCB

Voltando ao exercício de decomposição do gasto com juros, podemos observar que os demais componentes do pagamento líquido de juros nominais praticamente se compensaram entre 2023 e 2024 (Gráfico 4). A contribuição do juro real foi de 4,0 p.p para 3,1 p.p., refletindo em parte o afrouxamento monetário ocorrido até meados do ano. De toda forma, isoladamente, o componente do juro real ainda representa a maior parcela da composição do pagamento de juros nominais.

A contribuição da correção monetária saiu de 2,3 p.p. para 2,6 p.p., fruto da aceleração da inflação entre 2023 e 2024.

Já a parte advinda do custo de carregamento dos ativos de renda fixa do governo acelerou de 0,9 p.p. do PIB, em 2023, para 1,4 p.p. do PIB em 2024. A despeito de o BCB ter vendido cerca de US$ 35 bilhões no fim de 2024 para conter o movimento de depreciação cambial, o aumento do diferencial das taxas de juros doméstica e internacional fez o custo de carteira dos ativos de renda fixa se elevar.

Todos esses componentes podem ser vistos de maneira agregada no Gráfico 4.

Gráfico 4. Juros líquidos pagos pelo setor público no Brasil – juro real, correção monetária,
custo de carteira, swaps cambiais e fator de segunda ordem (% PIB)

Gráfico, Gráfico de mapa de árvore</p>
<p>Descrição gerada automaticamente

Fonte: BCB

Conclusão

O esforço de melhoria do resultado primário do setor público consolidado em 2024 não foi suficiente para melhorar significativamente o resultado nominal. Isso ocorreu por conta do aumento expressivo no pagamento líquido de juros nominais.

O déficit nominal é uma variável importante para determinação da dinâmica da dívida pública. Melhorias no resultado primário podem ser ineficazes diante de uma deterioração em termos de pagamento de juros nominais. O determinante maior dessa elevação do pagamento de juros nominais ficou a cargo do resultado dos swaps cambiais do BCB utilizados para intervenções no mercado de câmbio. O movimento de depreciação cambial aumentou de forma significativa o componente dos swaps cambiais no pagamento de juros nominais. Os demais componentes tiveram movimentos compensatórios entre si.

Em termos prospectivos, o processo de aperto monetário em curso tende a elevar o componente de juro real da despesa líquida de juros nominais. No mesmo sentido, o aumento do diferencial entre o juro interno e o externo tende a elevar o custo de carregamento dos ativos de renda fixa do governo, em particular das reservas internacionais. As projeções de mercado apontam ainda para aceleração da inflação, o que irá pressionar o componente de correção monetária do pagamento de juros. A dinâmica da taxa de câmbio, que sempre apresenta incertezas, vai determinar a variação do componente dos swaps cambiais. Assim, com todos esses movimentos em conjunto, é de se esperar que, no ano de 2025, o governo siga apresentando um gasto elevado com juros. Encontrar meios para reduzir esse gasto será primordial para garantir uma evolução mais benigna para a trajetória da dívida pública.


Referências

BCB – BANCO CENTRAL DO BRASIL. Estatísticas fiscais. Banco Central do Brasil, Brasília, DF, 31jan. 2025. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/estatisticas/estatisticasfiscais. Acesso em: 31 jan. 2025.

BNDES – BANCO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL Decomposição do pagamento de juros nominais líquidos no Brasil. Rio de Janeiro: Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, 2024. (Estudos Especiais do BNDES, n. 29). Disponível em: https://web.bndes.gov.br/bib/jspui/bitstream/1408/25245/1/PRFol_216214_Decomposição%20do%20pagamento%20de%20juros%20liquidos.pdf. Acesso em: 31 jan. 2025

BNDES – BANCO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL Atualizando a Decomposição do pagamento de juros nominais líquidos no Brasil 2002-2024. Rio de Janeiro: Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, 2024. (Estudos Especiais do BNDES, n. 40). Disponível em: https://web.bndes.gov.br/bib/jspui/bitstream/1408/26327/1/PRFol_216350_Atualizando%20decomposição%20do%20pagamento%20de%20juros__.pdf. Acesso em: 13 fev. 2025.

BORÇA JR., Gilberto; BARBOSA-FILHO, Nelson H. Ajuste do orçamento financeiro e custo de carregamento da dívida pública no Brasil 2002-2021. Revista de Economia Política, São Paulo, v. 43, n. 1, p. 110-124, janeiro-março/2023. Disponível em: https://doi.org/10.1590/0101-31572023-3337. Acesso em: 01 fev. 2025.

 

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