Renúncias tributárias: base de dados

Renúncias tributárias: base de dados

29/09/2021

A Emenda Constitucional 109/2021 determinou ao Governo o envio de uma proposta de revisão de renúncias tributárias para reduzir o montante atual de 3,95% do PIB, segundo as projeções divulgadas no PLOA 2022, para 2% do PIB.

Inicialmente, o governo encaminhou a proposta sem exceções, mas ao longo do processo legislativo, ressalvaram-se as renúncias mais expressivas tais como: o Simples Nacional, Entidades sem fins lucrativos, Fundos Constitucionais, Zona Franca de Manaus e a desoneração da cesta básica.

Tais exceções fizeram com que o limite inferior de 2% do PIB fosse praticamente atingido só com as ressalvas porque se referem às renúncias mais importantes, conforme apresentado na tabela a seguir:

Principais gastos tributários (Projeções 2022)

 

R$

% Total

% do PIB

Simples Nacional

81.810.206.155

22,05

0,87

Zona Franca de Manaus e Áreas de Livre Comércio

45.588.815.895

12,29

0,49

Fundos Constitucionais

1.306.244.597

0,35

0,01

Entidades Sem Fins Lucrativos - Imunes / Isentas

27.359.272.900

7,37

0,29

Agricultura e Agroindústria - Desoneração Cesta Básica

30.564.817.589

8,24

0,33

Sub-Total (Ressalvados)

186.629.357.136

50,29

1,99

Demais (Não Ressalvados)

184.443.596.304

49,71

1,96

Total Geral

371.072.953.440

100,0

3,95

Fonte: PLOA, valores projetados para 2022.

Reportagem do Estadão, na última semana, informou que o governo enviou uma proposta que reduzia o excesso de renúncias em relação aos 2% do PIB não ressalvados. O entendimento jurídico para aplicação do programa fez, na prática, com que a proposta produzisse uma revisão de apenas R$ 22,4 bilhões, conforme a notícia. Aparentemente, o governo interpretou as ressalvas de modo a elimina-las da base de cálculo do Plano e não apenas como as renúncias que não deveriam ser alvo dos cortes, alterando, portanto, o espírito original da proposta.

Ao excluir as ressalvas da base de cálculo, o corte proposto pelo ficou muito pequeno porque na prática a meta de renúncias tributárias, ao invés de ser 2%, se tornou algo mais próximo de 4%. A diferença entre os valores apresentados na Tabela e na reportagem pode ser explicada a partir de distintas metodologias entre valores projetados e realizados.

O dado realizado para 2020, última informação disponível pela SECAP do Ministério da Economia, informa que o total de renúncias atingiu 4,3% do PIB. Ou seja, por esta métrica, o corte necessário das renúncias tributárias seria da ordem de 0,3 p.p. do PIB para atingir a meta do programa.

De onde saiu a meta inicial de 2% do PIB? Aparentemente, a ideia seria voltar para o ano de 2003, quando as renúncias atingiram essa marca.

Renúncias Tributárias (% do PIB)

Fonte: SECAP, ME.

Independente da atual abordagem do governo, o fato é que esse é um dos temais fiscais mais incompreendidos e com avanços que parecem tímidos nos últimos anos, o que gera recorrente frustração de expectativa.

A revisão das renúncias tributárias é importante para (i) tornar o sistema tributário mais neutro, reduzindo distorções na alocação de recursos que devem migrar para os setores mais produtivos e não para os menos tributados, e (ii) reduzir a carga tributária de forma horizontal com maior arrecadação oriunda dessa revisão. Assim, a tributação ideal sobre o consumo deveria ter como base uma alíquota única.

O Observatório de Política Fiscal divulga uma base de informações com estatísticas de renuncias tributárias para o Brasil e outros países de modo a contribuir na compreensão do tema. A primeira fonte de informação refere-se ao histórico de renúncias tributárias no Brasil, tal como apresentado no gráfico anterior.

A base de dados apresenta, ainda, as informações estatísticas a partir de séries históricas, decomposições por tipo de imposto e por programas a partir das fontes oficiais.

No caso das comparações internacionais, apresenta-se informações do Global Tax Expenditure Database, disponível em: https://gted.net/ e do Centro Interamericano de Administraciones Tributárias, disponível em: https://www.ciat.org/?lang=en

É importante tomar alguns cuidados com as informações estatísticas. De forma geral, as informações estatísticas de renúncias tributárias são muito superestimadas o que traz a falsa impressão de que é possível arrecadar muito. A vasta maioria dos dados são relatados com base na abordagem da perda de receita. Nessa metodologia, estima-se o quanto uma empresa ou setor deveria pagar de impostos se lhe fosse aplicada a alíquota base do imposto.

A metodologia da perda de receita é estática e não leva em conta possíveis respostas comportamentais à alteração tributária. O método não considera o impacto potencial da renúncia no nível geral de atividade econômica e, portanto, nas receitas fiscais agregadas. Assim, as estimativas de custo excedem os ganhos de receita que resultariam da eliminação da renúncia.

Tais medidas estatísticas representam um relevante esforço de estudiosos, mas é forçoso reconhecer sua imprecisão. Na maior parte dos casos, não é possível obter informações subnacionais de modo que a comparação se dá em nível federal. Isso não é um grande problema para países centralizados, mas é uma limitação importante nos países de tradição federativa.

São exemplos de países federativos que só divulgam dados em nível federal: Brasil, Canadá e EUA. A Alemanha, por sua vez, integra as informações. Em outros países centralizados, as renúncias federais respondem pela parcela principal do total o que causa menos distorções. Para aprofundar essa informação, recomenda-se consulta aos manuais produzidos pelas respectivas instituições[1].

Quando se observa as estatísticas internacionais, o Brasil encontra-se próximo da média internacional. Mas na maior parte dos países cuja comparação aparece de forma mais recorrente como emergentes e OCDE, nos situamos um pouco abaixo.

Comparação internacional – Renúncias Tributárias (% do PIB)

País

Ano base

Renúncia Fiscal

África do Sul

2018

4,31

Alemanha

2018

0,88

Argentina

2019

2,73

Austrália

2019

8,38

Áustria

2019

4,36

Bélgica

2019

3,71

Brasil

2019

4,23

Bulgária

2019

0,61

Camarões

2019

2,6

Canadá

2019

6,48

Chile

2018

3,22

Colômbia

2018

7,74

Congo

2018

0,54

Coréia do Sul

2019

2,67

Costa Rica

2019

4,68

Dinamarca

2019

2,25

Equador

2019

5,29

Espanha

2019

3,02

EUA

2019

6,81

Finlândia

2019

11,99

França

2019

3,69

Grécia

2019

5,05

Guatemala

2019

3,82

Guiné

2018

1,68

Honduras

2019

6,86

Hungria

2019

2,24

Índia

2019

1,42

Indonésia

2019

1,6

Irlanda

2019

5,76

Islândia

2019

3,16

Itália

2019

3,43

Japão

2018

7,58

Marrocos

2019

2,48

Mauritânia

2013

7,99

México

2019

3,82

Nicarágua

2019

5,74

Noruega

2019

4,27

Nova Zelândia

2019

1,39

Panamá

2017

3,62

Paraguai

2014

1,41

Polônia

2015

5,04

Portugal

2018

5,6

Reino Unido

2019

7,53

Romênia

2019

4,79

Rússia

2019

14,38

Senegal

2014

6,04

Suécia

2019

4,55

Tanzânia

2017

0,87

Turquia

2019

4,16

Uruguai

2019

6,28

Média

 

4,45

Fonte: https://gted.net/

A base de dados traz ainda comparações, entre países, do CIAT por tipo de imposto. Com relação a essa comparação, cabe notar que as renúncias brasileiras são inferiores à experiência internacional tanto no consumo, imposto de renda e patrimônio. Cumpre notar que, como existe a limitação de informação de governos subnacionais e considerando, a importância do o ICMS nesse assunto, esse tipo de informação merece um uso cuidadoso por parte dos usuários[2].

Boa consulta. Link para o arquivo.


[2] O mesmo tipo de ressalva serva para o sales tax norte-americano e demais países de tradição federativo. Sugere-se, nesse caso, consulta ao s manuais da OCDE sobre IVA.

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