Metodologia de estimação dos gastos tributários estaduais e dados do TECR - Brasil

Metodologia de estimação dos gastos tributários estaduais e dados do TECR - Brasil

16/12/2024

A presente nota técnica tem como objetivo detalhar a coleta e a classificação dos dados de gastos tributários estaduais de 2002 a 2025, divulgados com exclusividade no Relatório Nacional de Gastos Tributários.

Os gastos tributários estaduais são definidos como toda renúncia de receita divulgada pelos Estados. Em geral, essas informações são divulgadas nas respectivas Leis de Diretrizes Orçamentárias (LDO), por meio do Demonstrativo de Estimativa e Compensação de Renúncia de Receita, incluído no Anexo de Metas Fiscais, em conformidade com o art. 4º, § 2º, inciso V, da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

As LDOs estão disponíveis online, mas os estados adotam diferentes práticas de centralização dessas informações. Em alguns casos, como no Rio Grande do Sul, São Paulo e Minas Gerais, as informações concentram-se nos sites das Secretarias de Fazenda. Há muitos estados, por sua vez, que apresentam estes dados pela Secretaria de Planejamento. Em outros estados, porém, os dados estão dispersos entre portais das secretarias, o Portal da Transparência ou, ocasionalmente, o site da Assembleia Legislativa. Isso evidencia a falta de uniformidade na divulgação e no acesso às LDOs.

Observa-se ainda que, em muitas UFs, as LDOs estão disponíveis online apenas a partir de 2010. Para períodos anteriores, foi necessário recorrer à Lei de Acesso à Informação (LAI) para solicitar os dados diretamente aos estados. Em várias respostas, as LDOs solicitadas já estavam publicadas online, porém em endereços digitais de outros órgãos do Estado.

Outros entes federativos informaram que as peças orçamentárias referentes aos anos solicitados não estavam disponíveis para acesso online. Um exemplo é a resposta da Secretaria do Planejamento do Piauí (SEPLAN/PI): “Em resposta à sua solicitação referente ao período de 2002 e 2003, informamos que esses documentos não estão mais disponíveis em nossos arquivos atuais, em conformidade com a Lei nº 8.159/1991, que dispõe sobre a política nacional de arquivos públicos”. Alguns estados alegaram que a responsabilidade pelo fornecimento das informações cabia a outro órgão estadual, como ocorreu no Rio de Janeiro, onde a divulgação online era atribuída a outro departamento. Por fim, alguns estados responderam fornecendo apenas as LDOs que já estavam disponíveis, sem atender à solicitação específica de dados faltantes.

Ao obter acesso às LDOs, os dados de estimativa de renúncia de receita são coletados a partir do Anexo de Metas Fiscais. O formato de disponibilização do dado é também heterogêneo. Enquanto alguns estados disponibilizam no mesmo arquivo da Lei, outros disponibilizavam os dados em separado com o Anexo de Metas Fiscais. Em muitos casos, especialmente para as LDOs mais antigas (período de 2002 a 2006), só há o texto da lei, sem os Anexos.

Nos casos em que a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) está disponível, mas sem conter os Anexos de Metas Fiscais, o dado foi classificado como "não disponível" (ND). Outra situação recorrente é a disponibilização da LDO acompanhada do Anexo de Metas Fiscais[1], mas sem o Demonstrativo de Estimativa de Renúncia de Receita. É importante destacar que, mesmo diante da obrigatoriedade prevista, muitos estados deixam de publicar determinados demonstrativos, ainda que apresentem outros em conformidade com a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Nessas circunstâncias, a ausência do Demonstrativo de Estimativa de Renúncia de Receita também resultou na classificação do dado como "não disponível" (ND).

Com acesso ao Demonstrativo desejado, verifica-se que alguns estados não têm a estimativa de renúncia explicitamente divulgada. Em geral, verificou-se três tipos de justificativas: (i) o estado se utilizou de uma interpretação sobre o conceito de renúncia de receita e da legislação vigente e, assim entendeu, que não cabia a divulgação destas estimativas[2]; (ii) o estado avalia que não há renúncia sem compensação a ser divulgada, e que foram “expurgados da receita estimada”[3]. É o caso de UFs que declaram renúncia de receita no exercício, mas avaliam, muitas vezes de forma qualitativa, que a renúncia é compensada no planejamento orçamentário ou gera um aumento de receita. Por fim, (iii) o estado não divulga nem justifica o motivo[4]. Para todos estes casos, considera-se como “ND” pela não disponibilização do dado.

Por fim, são descritos os casos em que as LDOs disponibilizaram valores referentes à estimativa de renúncia de receita. Observa-se uma grande diversidade na forma como essas informações são apresentadas. Em alguns casos, os documentos mencionam apenas o valor total da renúncia, enquanto em outros incluem detalhes adicionais, como o tipo de tributo e o setor econômico beneficiado. Adicionalmente, no que diz respeito à metodologia de cálculo utilizada, nota-se uma variação significativa tanto entre os estados quanto, em alguns casos, ao longo do tempo dentro de um mesmo estado, quando essa metodologia é explicitada. Para períodos anteriores a 2018, mesmo com orientação do Manual da Secretaria do Tesouro Nacional, verifica-se esta heterogeneidade. A partir de 2019 é possível observar que os Estados estão mais homogêneos, tanto em sua divulgação, quanto na metodologia de cálculo, o que permite maior comparabilidade.

Um exemplo das diferentes metodologias ocorre quando os estados mudam os dados base para cálculo de projeção. Como exemplo ilustrativo, a LDO de 2018 de um estado, trouxe estimativas de renúncia de receita para os anos de 2016 a 2018. Utiliza-se, desse modo, a estimativa para 2016. Seguindo a metodologia, a LDO de 2019 estima de 2017 a 2019 e utiliza-se a informação para 2017. A partir de 2020, entretanto, há uma mudança: divulga-se a estimativa de 2020 a 2022, e perde-se a atualização da informação de 2019. Para casos como este, utiliza-se a projeção para os anos de 2018 e 2019, divulgada na LDO de 2019, que é dado disponível mais atual. São exemplos os estados da Paraíba (2017 e 2018), Rio de Janeiro (2018 e 2019), Amapá (2015), Acre (2022), Piauí (2023) e Roraima (2023 e 2024).

Uma exceção que merece destaque é o caso do estado do Rio Grande do Sul. Embora todas as LDOs desde 2002 estejam disponíveis, observa-se a seguinte particularidade: as LDOs de 2002 a 2004 não apresentam dados sobre renúncia de receita. No entanto, na LDO de 2005, são divulgadas estimativas de renúncia de receita que incluem dados do próprio ano e de anos anteriores, os quais foram incorporados na base consolidada. A Secretaria da Fazenda do Rio Grande do Sul (SEFAZ/RS) retomou, apenas em 2019, a divulgação de dados sobre renúncia de receita nas LDOs. Para o período de 2006 a 2018, foi utilizada uma estimativa publicada pela SEFAZ/RS em 2020, que consolida os gastos tributários referentes a esse intervalo. Essa publicação de 2020 também inclui diversas avaliações sobre a eficiência dos gastos tributários[5].

Por fim, é possível citar alguns exemplos dos casos em que os estados detalham sua metodologia. É o caso de Alagoas, que utiliza o método do “valor adicionado fiscal”, em que calcula a diferença entre o valor das saídas e das entradas de mercadorias. Já o estado da Bahia, estimou por um período com base na média de renúncia por empresa beneficiada. Enquanto São Paulo toma como base a alíquota média para cálculo de renúncia de receita, o estado do Espírito Santo estima o gasto tributário com ICMS com base na diferença entre o ICMS potencial e o ICMS real. No caso de Santa Catarina[6], que teve mudança metodológica considerável nos últimos anos, a LDO de 2024 destaca: “O Estado de Santa Catarina adotou o princípio da prudência na apuração da renúncia (renúncia técnica), calculando-a a partir da diferença entre a arrecadação hipotética sem o incentivo e a arrecadação efetiva com o incentivo. Assim, não se leva em consideração o fato de a empresa ter se instalado ou permanecido no Estado exclusivamente por conta do benefício concedido e que, eventual revogação, ensejaria a sua migração para outra Unidade da Federação mais atrativa do ponto de vista tributário. ” (“LDO Santa Catarina”, 2024)

Para acessar a base de dados do Relatório Nacional de Gastos Tributários clique aqui.


[1] Para alguns estados, como o Paraná, Mato Grosso do Sul, Ceará por muitos anos foram divulgadas nas LDOs os Anexos de Metas Fiscais, tendo incluso todos os Demonstrativos exigidos, menos o de Estimativa e Compensação de Renúncia.

[2] “O governo do Estado do Ceará não programou para o período 2009-2011, a concessão de benefícios tributários concedidos em caráter não geral, não devendo ocorrer previsão de renúncia de receita tributária, haja vista que não ocorrerá falta de arrecadação de receita prevista no planejamento orçamentário, em função das medidas implementadas. Deverão permanecer os mesmos benefícios tributários, concedidos em caráter geral, existentes em exercícios anteriores, tratando-se de mera continuação dos benefícios já existentes, não comprometendo as metas fiscais estabelecidas pelo Estado, uma vez que os mesmos já estão expurgados da receita estimada. ” (“LDO Ceará”, 2009)

[3] O Estado do Mato Grosso do Sul, por exemplo, aplicou um entendimento derivado da Portaria da STN no 249 de 30 de abril de 2010 de que não havia renúncia ser reportada nas seguintes situações:  1) anteriores à promulgação da Lei Complementar n 101/2000; 2) decorrentes de incentivos fiscais pretéritos, compensados em período anterior ao de referência (2012-2014); 3) provenientes de legislação de âmbito nacional.” (“LDO Mato Grosso do Sul”, 2012).

[4] Caso do estado de Sergipe que apresentava em suas respectivas LDOs o Demonstrativo de Estimativa e Compensação de Renúncia de Receita, sem que apresentasse esses dados. A partir de 2024 apresenta estimativa com valores relevantes, considerando o tamanho do estado.

[5]Beneficios fiscais no Rio Grande do Sul: Uma análise econômica dos incentivos – ICMS. https://www.fazenda.rs.gov.br/upload/1599677676_ESTUDO_Beneficios_Fiscais_RS_08_setembro_2020.pdf

[6]Para Santa Catarina, em especial, há uma descrição da finalidade dos benefícios fiscais, seguindo a nomenclatura utilizada pelo estado: “Os benefícios fiscais de ICMS são concedidos com diversas finalidades: i) atração de empresas que jamais se instalariam no Estado sem o benefício fiscal (ex.: importadoras); ii) manutenção das empresas tradicionais de Santa Catarina dentro do território (ex.: agroindústria, metalomecânico); iii) atendimento de interesse público de nível nacional (Zona Franca de Manaus); iv) questões sociais (cesta básica, medicamentos especiais, incentivo à cultura); v) sobrevivência das empresas num ambiente de crise (têxtil, na concorrência com produtos importados).” (“LDO Santa Catarina”, 2024)

 

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV. 

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